POR QUE EU FUI ABRIR A BOCA?
Você foi alertada pela sua bisavó, pela sua avó e pela sua mãe: o silêncio é de ouro. Mas não adiantou nada, como não vai adiantar quando você tentar passar essa máxima para sua filha. Mulher tem um certo descontrole verbal, está no nosso DNA. Você sai com as amigas e antes do segundo chope já está quebrando aquele juramento de nunca contar nenhuma novidade antes que ela se confirme. Desobedecendo a si própria, lá está você comentando sobre uma promoção que talvez pinte em novembro, sobre o azarão que talvez vire namoro, sobre a viagem a Patagônia que talvez você faça no final do ano. Não dá para amarrar a língua dentro da boca?
Menos mal que você está falando do que lhe diz respeito. O estrago começa quando a gente se põe a falar de uma amiga, quando a gente comete uma indiscrição relativa à nossa irmã, quando a gente entrega um segredo que era propriedade privada de outra pessoa. Tudo coisinha à toa, um comentariozinho de nada, fofoquinhas sem importância. Mas que ressaca que bate na manhã seguinte.
Você disse que detestou um filme cujo diretor é um dos seus melhores amigos. Você espalhou que o marido da Fulana é o campeão da grosseria e amanhã compartilharão a mesma mesa numa festa. Você admitiu que não suporta saraus e já freqüentou vários com o sorriso nas orelhas, sua falsa. Você entregou as três plásticas que sua cunhada fez no rosto e ela pediu tanto que você não contasse. Escapou, ué. Quanta frescura, o que é que tem fazer plástica?
Pra você pode não haver razão nenhuma para segredo, mas se alguém lhe contou algo em confidência, custa fechar a matraca? Não custa, mas nossa voz é rápida no gatilho, não lê as placas de advertência, quando vê, já avançou o sinal, já foi, está lá adiante. Rebobinar a fita, impossível. Fica então aquele gostinho azedo na boca, de quem não cometeu nenhum pecado grave, mas perdeu uma bela oportunidade de ser elegante.
Reza a lenda que chiques são as mulheres que falam pouco. As econômicas. Aquelas que apenas sorriem, enquanto as outras, histéricas, falam todas ao mesmo tempo. Mulheres caladas, controladas, que nunca dizem algo inconveniente. Elas mantêm um ar enigmático. Dão a entender que já passaram pela fase de palpitar sobre tudo. Disseram o que tinham para dizer no divã do analista e, agora, mais maduras, descobriram a arte de escutar. Só dando na cara.
Eu sei, eu sei, puro recalque. E olha que eu nem tenho motivo para isto, no planeta de onde venho sou considerada até bem reservada. Mas, vez que outra, me empolgo e pronto: descambo para a tagarelice. Com a melhor das intenções, diga-se. Tudo em nome da honestidade. Por que eu confirmei que o cabelo dela está tenebroso? Porque ela perguntou, ora. Por que eu disse para ele não me ligar nunca mais? Porque naquela hora eu estava tomada pelo ódio. Mas agora eu quero!
Em nome da honestidade, cometemos algumas indelicadezas e precipitações. Como sofre uma mulher: ela precisa ser autêntica e, ao mesmo tempo, discreta. Ter opinião, mas nunca dizer uma leviandade. Ser sábia, porém nunca imprudente.
Na próxima encarnação, não quero vir honesta, nem desonesta. Quero vir muda.